sexta-feira, 4 de abril de 2014

O QUE VEM EM PRIMEIRO LUGAR


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            No século passado, marcado profundamente pela “Guerra Fria” (1945-1991), encabeçada pelos Estados Unidos da América do Norte e União Soviética, a preocupação reinante dos líderes mundiais era a tensão entre Leste e Oeste. A mídia mundial também se dedicava exaustivamente a esta questão. Havia, porém, alguém que procurava abrir os olhos do mundo para uma grave tribulação, pouco reportada na mídia. Era Dom Helder Camara, uma voz que ecoava pelo mundo afora. Ele afirmava: “O problema fundamental não é o confronto entre Leste e Oeste, mas entre Norte e Sul, entre países ricos e países pobres. Comunismo e anticomunismo é uma questão secundária.” Sem querer banalizar, de forma alguma, aquele conflito político-econômico e militar, o Dom da Paz procurava alertar a todos por um problema que se alastrava por toda a história da humanidade, agravando-se a cada ano pelo mundo afora: a maldita divisão do planeta terra entre ricos e pobres, Norte e Sul. Era esta a problemática sobre a qual toda a humanidade, todos os governos e demais instâncias haviam de debruçar-se. O conflito tenso entre Leste e Oeste somente aumentava a situação de pobreza e miséria. “Atenção, meus Irmãos-Homens! A violência n.º 1 é a miséria. Miséria que engloba sub-habitação, sub-trabalho, sub-diversão, sub-saúde, sub-vida, opressão ... dominação!” (Dom Helder em sua “Sinfonia dos dois mundos”).

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            Lembrei-me desta profética denúncia do “Profeta do Século XX”, ao assistir a noticiários televisivos, reportando o encontro entre o Papa Francisco e o presidente estadunidense Barack Obama. Os comentaristas destacaram, repetidamente, que os dois líderes mundiais não tocaram em assuntos polêmicos como homoafetividade, mulheres para o sacerdócio, padres pedófilos, união de casais do mesmo sexo, escândalos financeiros do Banco do Vaticano, etc., mas somente “conversaram sobre temas como o combate à pobreza e a paz mundial”.

 

            Que pena! Nenhum tema polêmico! Nenhuma divergência! Nenhuma acusação! Nenhum assunto ‘quente’! Nenhuma discordância entre os dois. Nenhum dedo em riste! Aquelas reportagens davam a impressão que a pobreza não seria um tema polêmico, divergente ou ‘quente’, e a paz mundial pouco relevante.

 

Quero refletir sobre qual compreensão temos do Papa Francisco e de sua importância para o momento atual do mundo e da Igreja, inserida na realidade deste mundo. Através da leitura que faço do seu modus vivendi, da maneira dele se apresentar, seus gestos, de tudo que fala e escreve, percebo, com muita clareza, que ele quer, em primeira instância e urgentemente, acordar a Igreja, toda a sociedade e, consequentemente, cada um(a) de nós, a fim de enxergarmos o que realmente é importante, o que está acontecendo no mundo e qual deve ser a nossa primordial preocupação. Trata-se do problema da crescente pobreza. Ele se questiona a si mesmo, interroga a Igreja e chama a nossa atenção, porque a aflição em relação à pobreza e aos pobres não é algo criado por ele, a sim é uma exigência que vem de dentro do Evangelho de Cristo, no qual os pobres - em concordância e continuidade com a tradição bíblica desde os tempos do Antigo Testamento - são os preferidos de Deus, os primeiros a receberem a Boa Nova, os escolhidos para formarem o povo no Reino de Deus.

 

A fim de não alongar-me, apresento apenas dois exemplos de como o Papa Francisco expressa esta sua preocupação de diversas maneiras:

  • Sobre a política econômica que rege o mundo, ele dá um claro “não a uma economia da exclusão e da desigualdade social”, a economia que mata: “Não é possível que a morte por enregelamento de um idoso sem abrigo não seja notícia, enquanto o é a descida de dois pontos na Bolsa. Isto é exclusão. Não se pode mais tolerar o fato de se lançar comida no lixo, quando há pessoas que passam fome. Isso é desigualdade social: a cultura do ‘descartável’ que faz dos excluídos ‘resíduos’, ‘sobras’.” (Exortação “Alegria do Evangelho”, n.º 53).
  • Em diálogo com os superiores gerais das ordens e congregações masculinas, ele diz: “É preciso olhar  tudo a partir da periferia. É preciso andar na periferia para conhecer de verdade como vivem as pessoas. Caso contrário, corre-se  o risco de um fundamentalismo de posições rígidas com base em uma visão centralizada. Isto não é saudável (…) Hoje Deus está nos pedindo para deixar o ninho que nos acomoda. Também  aquele que está na clausura é enviado através da sua oração para que o Evangelho possa crescer no mundo. Estou convencido de que a chave hermenêutica mais importante é o cumprimento do mandato evangélico: ‘Ide’! ‘Ide’!” (28-11-2013).
     

É claro que aqueles outros assuntos (pedofilia, escândalos financeiros etc.) são de grande relevância, mas, para o Papa Francisco não estão em primeiro plano. Ele sabe muito bem que estas temáticas têm ocasionado, por parte da Igreja, atitudes pouco evangélicas ao longo da história, posicionamentos procedentes de visões de moral e ética temporárias, portanto sujeitas à mudança. Por conseguinte, acerca de todas estas questões, urge agora, antes de tudo, um profundo e sincero diálogo.  O Papa Francisco aponta para esta atitude de escuta e busca de entendimento, quando diz: “Quem sou eu para julgar!?”.

 

Quem sabe, se abordássemos todas estas questões, partindo do mundo dos pobres, nossas ideias e convicções poderiam transformar-se.

 

Fortaleza, 02-04-2014,

Geraldo Frencken – geraldof73@yahoo.com.br

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