sexta-feira, 31 de maio de 2013

Progresso longe da solidariedade

Por Padre Geovane Saraiva*

Uma realidade incômoda, diante do contraste e do antagonismo em que se passa atualmente a nossa sociedade e de um modo bem concreto, a cidade de Fortaleza e o Estado do Ceará, deixando transparecer que o projeto dos homens anda léguas e léguas, distante do projeto do nosso Deus e Pai, anunciado por Jesus de Nazaré, projeto de justiça, amor, solidariedade e paz, no serviço aos irmãos, quando nos afirma no seu Evangelho: “se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e o servo de todos” (Mc 9,35).

Neste sentido, como transformar a realidade dos sofredores? Precisamos do Espírito da verdade para que possamos ser conduzidos, segundo o referido projeto do Pai, a plena verdade. Jesus na sua entrega e obediência à vontade D’aquele que o enviou, até a morte e morte na cruz, deixa claro para nós que abraçamos a fé, no desejo de perseguir seu seguimento, tendo na mente e no coração o consequente mandamento do amor.

Como é preciosa e plausível uma reflexão sobre Fortaleza, bela cidade, mas com inúmeras coroas de espinhos, seja pelos moradores de rua (adultos e crianças) nas nossas praças e ruas , seja pelas favelas, desemprego, dependência química, como consequência, o alto índice de criminalidade. Aqui é extremamente válida e sábia a assertiva de Albert Einstein: “A palavra ‘Progresso’ não terá qualquer sentido enquanto houver crianças infelizes (…)”.

O progresso que se acentua, fortemente presente entre nós, nos estrondosos volumes de recursos, na construção do aquário na nossa cidade, das obras da copa do mundo, dos milhões que serão gastos com a construção da ponte estaiada, sobre o Rio Cocó, contrariando todo um rigoroso estudo dos nossos sábios e prestimosos ambientalistas e arquitetos, comprometendo aquilo que temos de melhor, o pulmão verde e todo o ecossistema da cidade Fortaleza. Dom Aloísio, na sua Carta Pastoral sobre o uso e a posse do solo urbano, de 31.05.1989, afirmou com maestria: “A cidade deve ser para o homem e não o homem para a cidade. Deve ser um espaço de convivência solidária para todos os que nela moram, convivência que seja resultante da convergência de esforços para tornar a cidade mais humana e também cristã” – uma cidade verdadeiramente cristã e fraterna, revelando um rosto pascal.

Veja querido leitor o que nos disse o Papa Francisco na Vigília de Pentecostes, de 18/04/2013: “Tocar no corpo do pobre é tocar no corpo de Cristo. O Pontífice contou a história de um rabino do século XII que narra a construção de torres, onde os tijolos eram mais importantes do que os construtores. Quando um tijolo se quebrava, era um drama e o operário era punido. Mas se um operário se machucava, isso não tinha nenhum problema. Isso acontece hoje: se os investimentos nos bancos caem, é uma tragédia. Mas se as pessoas morrem de fome, não têm o que comer ou não têm saúde, não é um problema! Esta é a nossa crise de hoje! E o testemunho de uma Igreja pobre para os pobres vai contra esta mentalidade”.

Encerramos nossa reflexão com as sábias palavras do Cardeal Aloísio Lorscheider, em outra Carta Pastoral, de 19/06/1983, escrita há 30 anos, com o título “Os bispos do Ceará e a seca: “Relembrando as palavras do Evangelho, nem sempre é possível dizer só coisas lindas. Na realidade, o Evangelho sempre é lindo. Mas os nossos pecados ficam achando que certas passagens do Evangelho são duras. Você deve lembrar que já para Jesus a turma de então dizia: ‘Quem pode ouvir estas palavras? Elas são duras’ (Jo 6,60). E o resultado: Desde então muitos dos discípulos se retiraram e já não seguiam (Jo. 6,66). Hoje acontece a mesma coisa. Há muita gente por aí que chama a Igreja Católica, no Brasil, de subversiva, comunista, dizendo que esta não é a Igreja deles, e procuram outra Igreja que fale menos duro. Já muitos que antes estavam com igreja católica, agora já não estão mais; retiraram-se; já não a seguem. Para eles, a palavra da Igreja, que é a palavra do Evangelho lida para a nossa situação, para nosso contexto, é muito dura ou muito forte. E conclui: Peço que ninguém fique com raiva, mas pense”.

*Padre da Arquidiocese de Fortaleza, escritor, membro da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza, da Academia de Letras dos Municípios do Estado Ceará (ALMECE) e Vice-Presidente da Previdência Sacerdotal – Pároco de Santo Afonso – geovanesaraiva@gmail.com

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