Cidade do Vaticano
(RV) – A Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”, do Papa Francisco, foi
apresentada esta manhã na Sala de Imprensa da Santa Sé.
Participam da
coletiva de imprensa o Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova
Evangelização, Dom Rino Fisichella, o Secretário-Geral do Sínodo dos Bispos, Dom
Lorenzo Baldisseri, e o Presidente do Pontifício Conselho das Comunicações
Sociais, Dom Claudio Maria Celli.
O documento do Pontífice nasce da XIII
Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos sobre “A nova evangelização para
a transmissão da fé cristã”, de 2012.
leia mais:
O Papa Francisco reelabora o que
emergiu desse Sínodo de modo pessoal, escrevendo um documento programático e
exortativo, utilizando a forma de “Exortação Apostólica”. Como tal, tem estilo e
linguagem próprios: coloquial e direto, como manifestou Francisco em seus meses
de pontificado.
A missionariedade é o coração do texto, em que o Papa
convida todos os fiéis cristãos a uma nova etapa evangelizadora, caracterizada
pela alegria.
Trata-se de cinco capítulos: “A transformação missionária
da Igreja”, “Na crise do compromisso comunitário”, “O anúncio do Evangelho”, “A
dimensão social da evangelização” e “Evangelizadores com espírito”.
“O
que mantém unido todas essas temáticas é o amor misericordioso de Deus, que vai
ao encontro de cada pessoa”, afirmou Dom Rino Fisichella.
Para ele, o que
o Papa nos indica, no fundo, “é a Igreja que se faz companheira de percurso dos
nossos contemporâneos na busca de Deus e no desejo de vê-lo”.
Por sua
vez, Dom Baldisseri destacou o caráter universal do documento, elaborado a
partir dos estímulos pastorais provenientes de várias Igrejas locais. “A esta
experiência, deve-se o amplo espaço dedicado à religiosidade popular na América
Latina – uma verdadeira espiritualidade encarnada na cultura dos mais simples”,
acrescentou o Arcebispo.
Em entrevista à Rádio Vaticano, Dom Baldisseri
destaca dois aspectos da Exortação: o fim do eurocentrismo e a dimensão dos
pobres. Ouça aqui:
Confira uma síntese da Exortação Apostólica, preparada pela Rádio
Vaticano:
"A alegria do evangelho enche o coração e a vida inteira
daqueles que se encontram com Jesus": assim inicia a Exortação Apostólica
"Evangelii Gaudium" com a qual o Papa Francisco desenvolve o tema do anúncio do
Evangelho no mundo de hoje, recolhendo por outro lado a contribuição dos
trabalhos do Sínodo que se realizou no Vaticano de 7 a 28 de Outubro de 2012 com
o tema "A nova evangelização para a transmissão da fé". "Desejo dirigir-me aos
fiéis cristãos - escreve o Papa - para convidá-los a uma nova etapa de
evangelização marcada por esta alegria e indicar direcções para o caminho da
Igreja nos próximos anos" (1). Trata-se de um premente apelo a todos os
baptizados para que com renovado fervor e dinamismo levem aos outros o amor de
Jesus num "estado permanente de missão" (25), vencendo "o grande risco do mundo
actual”, o de cair "numa tristeza individualista" (2).
O Papa nos convida
a "recuperar a frescura original do Evangelho”, encontrando "novas formas" e
"métodos criativos", a não aprisionarmos Jesus nos nossos "esquemas monótonos"
(11). Precisamos de uma "uma conversão pastoral e missionária, que não pode
deixar as coisas como elas são" (25) e uma "reforma das estruturas" eclesiais
para que "todas se tornem mais missionárias" (27) . O Pontífice pensa também
numa "conversão do papado", para que seja "mais fiel ao significado que Jesus
Cristo lhe quis dar e às necessidades actuais da evangelização". A esperança que
as Conferências Episcopais pudessem dar um contributo para que "o sentido de
colegialidade" se realizasse “concretamente” – afirma o Papa - "não se realizou
plenamente" (32). E’ necessária uma “saudável descentralização" (16). Nesta
renovação não se deve ter medo de rever costumes da Igreja "não directamente
ligados ao núcleo do Evangelho, alguns dos quais profundamente enraizados ao
longo história" (43) .
Sinal de acolhimento de Deus é "ter por todo lado
igrejas com as portas abertas" para que aqueles que estão à procura não
encontrem "a frieza de uma porta fechada". "Nem mesmo as portas dos Sacramentos
se deveriam fechar por qualquer motivo". Assim, a Eucaristia "não é um prémio
para os perfeitos mas um generoso remédio e um alimento para os fracos. Estas
convicções têm também consequências pastorais que somos chamados a considerar
com prudência e audácia" (47). Reafirma de preferir uma Igreja "ferida e suja
por ter saído pelas estradas, em vez de uma igreja ... preocupada em ser o
centro e que acaba presioneira num emaranhado de obsessões e procedimentos. Se
algo nos deve santamente perturbar ... é que muitos dos nossos irmãos vivem "sem
a amizade de Jesus (49).
O Papa aponta as "tentações dos agentes da
pastoral": o individualismo, a crise de identidade, o declínio no fervor (78).
"A maior ameaça" é "o pragmatismo incolor da vida quotidiana da Igreja, no qual
aparentemente tudo procede na faixa normal, quando na realidade a fé se vai
desgastando" (83). Exorta a não se deixar levar por um "pessimismo estéril " (84
) e a sermos sinais de esperança (86) aplicando a "revolução da ternura" (88).
E’ necessário fugir da "espiritualidade do bem-estar" que recusa "empenhos
fraternos" (90) e vencer a “mundanidade espiritual”, que “consiste em buscar, em
vez da glória do Senhor, a glória humana" (93) . O Papa fala daqueles que "se
sentem superiores aos outros", porque " inflexivelmente fiéis a um certo estilo
católico próprio do passado" e "em vez de evangelizar ... classificam os
outros", ou daqueles que têm um "cuidado ostensivo da liturgia, da doutrina e do
prestígio da Igreja, mas sem que se preocupem com a inserção real do Evangelho"
nas necessidades das pessoas ( 95). Esta "é uma tremenda corrupção com a
aparência de bem ... Deus nos livre de uma igreja mundana sob cortinas
espirituais ou pastorais" (97) .
Ele lança um apelo às comunidades
eclesiais para não cairem nas invejas e ciúmes: “dentro do povo de Deus e nas
diversas comunidades, quantas guerras" (98). "A quem queremos evangelizar com
estes comportamentos?" (100). Sublinha a necessidade de fazer crescer a
responsabilidade dos leigos, mantidos "à margem nas decisões" por um "excessivo
clericalismo" (102). Afirma que "ainda há necessidade de se ampliar o espaço
para uma presença feminina mais incisiva na Igreja", em particular "nos
diferentes lugares onde são tomadas as decisões importantes" (103). "As
reivindicações dos direitos legítimos das mulheres ... não se podem sobrevoar
superficialmente" (104). Os jovens devem ter "um maior protagonismo" (106).
Diante da escassez de vocações em alguns lugares o Papa afirma que "não se podem
encher os seminários baseados em qualquer tipo de motivação"
(107).
Abordando o tema da inculturação, o Papa lembra que "o
cristianismo não dispõe de um único modelo cultural" e que o rosto da Igreja é
"multiforme" (116). "Não podemos esperar que todos povos ... para expressar a fé
cristã, tenham de imitar as modalidades adoptadas pelos povos europeus num
determinado momento da história" (118). O Papa reitera "a força evangelizadora
da piedade popular" (122) e incentiva a pesquisa dos teólogos convidando-os a
ter "a peito a finalidade evangelizadora da Igreja" e a não se contentar "com
uma teologia de escritório" (133).
Em seguida o Papa detém-se "com uma
certa meticulosidade, na homilia", porque "são muitas as reclamações em relação
a este importante ministério e não podemos fechar os ouvidos" (135). A homilia
"deve ser breve e evitar de parecer uma conferência ou uma aula " (138), deve
ser capaz de dizer "palavras que façam arder os corações", evitando uma
"pregação puramente moralista ou de endoutrinar" (142). Sublinha a importância
da preparação ", um pregador que não se prepara não é ‘espiritual’, é desonesto
e irresponsável" (145). "Uma boa homilia deve conter ... 'uma ideia, um
sentimento, uma imagem'" (157). A pregação deve ser positiva, para que possa
oferecer "sempre esperança" e não deixe "prisioneiros da negatividade" (159). O
próprio anúncio do Evangelho deve ter características positivas: "proximidade,
abertura ao diálogo, paciência, acolhimento cordial que não condena"
(165).
Falando dos desafios do mundo contemporâneo, o Papa denuncia o
actual sistema económico: "é injusto pela raiz" (59). " Esta economia mata"
porque prevalece a "lei do mais forte". A actual cultura do "descartável" criou
"algo de novo": “os excluídos não são ‘explorados’, mas ‘lixo’, 'sobras'" (53).
Vivemos uma "nova tirania invisível, por vezes virtual" de um "mercado
divinizado", onde reinam a "especulação financeira", "corrupção ramificada",
"evasão fiscal egoísta" (56). Denuncia os "ataques à liberdade religiosa" e as
"novas situações de perseguição dos cristãos ... Em muitos lugares trata-se pelo
contrário de uma difusa indiferença relativista" (61). A família - continua o
Papa - "atravessa uma crise cultural profunda" " Reafirmando “a contribuição
indispensável do matrimónio para a sociedade" (66 ), sublinha que "o
individualismo pós-moderno e globalizado promove um estilo de vida ... que
perverte os vínculos familiares" (67) .
O Papa Francisco reafirma "a
íntima conexão entre evangelização e promoção humana" (178 ) e o direito dos
Pastores "para emitir opiniões sobre tudo o que se relaciona com a vida das
pessoas" (182). "Ninguém pode exigir de nós que releguemos a religião à secreta
intimidade das pessoas, sem qualquer influência na vida social". Cita João Paulo
II onde diz que a Igreja "não pode nem deve ficar à margem da luta pela justiça"
(183). "Para a Igreja, a opção pelos pobres é uma categoria teológica" antes de
ser sociológica. "Por isso peço uma Igreja pobre para os pobres. Eles têm muito
a ensinar-nos" (198). "Até que não se resolvam radicalmente os problemas dos
pobres ... não se resolverão os problemas do mundo" (202). "A política, tanto
denunciada" - diz ele - "é uma das formas mais preciosas de caridade". "Rezo ao
Senhor para que nos dê mais políticos que tenham verdadeiramente a peito ... a
vida dos pobres!" Em seguida, um aviso: "qualquer comunidade dentro da Igreja"
que se esquecer dos pobres corre "o risco de dissolução" (207) .
O Papa
nos convida a cuidar dos mais fracos: "os sem-tecto, os dependentes de drogas,
os refugiados, os povos indígenas, os idosos cada vez mais sós e abandonados" e
os migrantes, para quem o Papa exorta os Países "a uma abertura generosa" (210
). Fala das vítimas de tráfico e de novas formas de escravidão: "Nas nossas
cidades está implantado este crime mafioso e aberrante, e muitos têm as mãos
cheias de sangue por causa de uma cumplicidade cómoda e silenciosa" (211).
"Duplamente pobres são as mulheres que sofrem situações de exclusão, maus tratos
e violência" ( 212) . "Entre estes fracos que a Igreja quer cuidar" estão "as
crianças em gestação, que são as mais indefesas e inocentes de todos, às quais
hoje se quer negar a dignidade humana" (213) . "Não se deve esperar que a Igreja
mude a sua posição sobre esta questão ... Não é progressista fingir de resolver
os problemas eliminando uma vida humana" (214). E depois, um apelo para o
respeito de toda a criação: "somos chamados a cuidar da fragilidade das pessoas
e do mundo em que vivemos" ( 216) .
No que diz respeito ao tema da paz, o
Papa afirma que é "necessária uma voz profética" quando se quer implementar uma
falsa reconciliação "que mantém calados" os pobres, enquanto alguns "não querem
renunciar aos seus privilégios" (218). Para a construção de uma sociedade "em
paz, justiça e fraternidade" indica quatro princípios (221): "o tempo é superior
ao espaço" (222) significa "trabalhar a longo prazo, sem a obsessão dos
resultados imediatos" (223). "A unidade prevalece sobre o conflito" (226)
significa operar para que os opostos atinjam "uma unidade multi-facetada que
gera nova vida" (228). "A realidade é mais importante que a ideia" (231)
significa evitar que a política e a fé sejam reduzidas à retórica (232). "O todo
é maior do que a parte" significa colocar em conjunto globalização e localização
(234).
"A evangelização - prossegue o Papa - também implica um caminho de
diálogo", que abre a Igreja para colaborar com todas as realidades políticas,
sociais, religiosas e culturais (238). O ecumenismo é "uma via imprescindível da
evangelização". Importante o enriquecimento recíproco: "quanras coisas podemos
aprender uns dos outros!", por exemplo", no diálogo com os irmãos ortodoxos, nós
os católicos temos a possibilidade de aprender alguma coisa mais sobre o sentido
da colegialidade episcopal e a sua experiência de sinodalidade" (246), " o
diálogo e a amizade com os filhos de Israel fazem parte da vida dos discípulos
de Jesus" (248 ), "o diálogo inter-religioso", que deve ser conduzido "com uma
identidade clara e alegre" , é " uma condição necessária para a paz no mundo", e
não obscurece a evangelização (250-251), "nesta época adquire notável
importância a relação com os crentes do Islão (252): o Papa implora
"humildemente" para que os Países de tradição islâmica garantam a liberdade
religiosa para os cristãos, mesmo "tendo em conta a liberdade de que gozam os
crentes do Islão nos países ocidentais". "Diante de episódios de fundamentalismo
violento" o Papa convida a "evitar odiosas generalizações, porque o verdadeiro
Islão e uma adequada interpretação do Alcorão se opõem a toda a violência" (
253). E contra a tentativa de privatizar as religiões em alguns contextos,
afirma que "o respeito devido às minorias de agnósticos ou não-crentes não se
deve impor de forma arbitrária, que silencie as convicções das maiorias de
crentes ou ignore a riqueza das tradições religiosas" (255). E reafirma,
portanto, a importância do diálogo e da aliança entre crentes e nã-crentes (257)
.
O último capítulo é dedicado aos "evangelizadores com o Espírito", que
são aqueles "que se abrem sem medo à acção do Espírito Santo", que "infunde a
força para anunciar a novidade do Evangelho com ousadia (parresia ), em voz alta
e em todo tempo e lugar, mesmo contra a corrente" (259). Trata-se de
"evangelizadores que rezam e trabalham" (262), na certeza de que "a missão é uma
paixão por Jesus mas, ao mesmo tempo, é uma paixão pelo seu povo" (268): "Jesus
quer que toquemos a miséria humana, que toquemos a carne sofredora dos outros"
(270). "Na nossa relação com o mundo – esclarece o Papa - somos convidados a dar
a razão da nossa esperança, mas não como inimigos que apontam o dedo e condenam"
(271). "Pode ser missionário - acrescenta ele - apenas quem se sente bem na
busca do bem do próximo, quem deseja a felicidade dos outros" (272): "se eu
conseguir ajudar pelo menos uma única pessoa a viver melhor, isto já é
suficiente para justificar o dom da minha vida" (274). O Papa convida-nos a não
desanimar perante as falhas ou escassos resultados, porque a "fecundidade muitas
vezes é invisível, indescritível, não pode ser contabilizada"; devemos saber
"apenas que o dom de nós mesmos é necessário" (279). A Exortação termina com uma
oração a Maria, "Mãe da Evangelização". "Existe um estilo mariano na actividade
evangelizadora da Igreja. Porque sempre que olhamos Maria voltamos a acreditar
na força revolucionária da ternura e do afecto"
(288).
Texto proveniente da página http://pt.radiovaticana.va/news/2013/11/26/fim_do_eurocentrismo_e_a_centralidade_dos_pobres:_síntese_da/bra-750121
do
site da Rádio Vaticano
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