“Estive participando dos últimos dias dos
festejos de Canindé, local onde acorrem devotos de São Francisco de vários
lugares do Brasil, especialmente do Nordeste. Ali veio à minha memória toda a
trajetória de Francisco de Assis já bastante conhecida, mas diante da referida
trajetória me veio um destaque -o diálogo do santo com o crucifixo na Igrejinha
de São Damião. Francisco pergunta: “Senhor, o que queres que eu faça?” o
crucifixo fala: “Não vês que a minha casa está caindo? Vai e restaura!”.
O papa Emérito, na Audiência Geral das
quartas-feiras, falando aos peregrinos no dia 27 de janeiro de 2010 (cf. site do
Vaticano), assim se expressou sobre o assunto:
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“Este simples acontecimento da palavra do Senhor
ouvida na Capela de São Damião esconde um simbolismo. Imediatamente São
Francisco é chamado a restaurar esta pequena Igreja, mas o estado de ruínas do
edifício é símbolo da situação dramática e preocupante da própria Igreja do
tempo, com uma fé superficial que não forma e não transforma a vida, com um
clero pouco zeloso, com o refrear-se do amor; contudo, no centro desta Igreja
está o crucifixo e fala: chama à renovação, chama a um trabalho e um trabalho
manual para reparar imediatamente a Igreja de São Damião, “símbolo da chamada
mais profunda a renovar a própria igreja de Cristo” (grifo nosso) com a sua
radicalidade de fé e com o seu entusiasmo de amor a Cristo”.
Este acontecimento do século XIII parece que está
rondando o imaginário dos católicos depois da eleição do papa Francisco. O que
vou dizer agora o faço apenas com o intuito de socializar algo que para grande
parte dos católicos engajados ou que acompanham minimamente as notícias da
Igreja e do atual papa não é novidade.
Em primeiro lugar é o primeiro para da história
que escolhe o nome de Francisco. A escolha do nome já pode indicar imediatamente
que existe toda uma inspiração de um papado, na esteira evangélica de uma Igreja
pobre e concretamente vivida pelo pobrezinho de Assis. Há uma analogia que não
se explica fazendo a transposição de uma época para outra, sem uma devida
hermenêutica e contextualização. O fato é que há uma convergência comum entre os
dois momentos, que á a crise da Instituição, marcada por uma série de problemas
e desafios.
O nome tem se evidenciado nos constantes gestos
testemunhados pelo papa, que se traduzem numa kenosis que atinge sobremaneira o
exercício do poder. Prova disto é que o papa nomeou uma comissão de oito
cardeais (Conselho de Cardeais), de vários continentes, iniciando assim o
diálogo para a reforma da Cúria e este fato está gerando muitas expectativas.
Percebam a coincidência dos dias em que o papa se reuniu com referida Comissão –
de 1º a três de outubro, portanto finalizou no dia do trânsito de São Francisco.
No dia 4 de outubro, (Dia de São Francisco), o papa foi a Assis acompanhado
desta Comissão o que aponta possivelmente para as necessárias restaurações de
que a Igreja necessita para hoje, tendo como paradigma evidentemente a pessoa e
a proposta de Jesus Cristo, com inspiração no nome que escolheu que deve apontar
para toda uma espiritualidade franciscana, para grandes aspectos de seu
pontificado.
Por aquilo que tem evidenciado, uma pergunta: Que
rumo está tomando a Igreja no pontificado do papa Francisco? Se não dá para
perceber de forma sistemática qual o rumo, os indicativos através dos gestos,
todos eles simples, mas que se agigantam pelo fato de ser testemunhado pelo papa
que quebra protocolos e, diga-se de passagem, inesperados, são claros. Lembro
entre inúmeros exemplos que poderia citar, a sua aparição no dia da eleição
pedindo para o povo o abençoar, ter ido ao hotel após sua eleição pagar sua
conta, no Rio de Janeiro no papa-móvel dispensou o vidro prova de bala que o
separava povo e quando usava o carro era um muito simples e com os vidros
baixados; no dia 19 de agosto deu uma entrevista à revista italiana Civiltà
Cattolica – ali o entrevistador perguntou ao Papa que Igreja ele “sonha”, qual a
maior necessidade da Igreja neste momento histórico?
Respondeu: “Capacidade de curar as feridas e de
aquecer o coração dos fiéis, a proximidade. Vejo a Igreja como um hospital de
campanha depois de uma batalha. É inútil perguntar a um ferido grave se tem o
colesterol ou o açúcar altos. Devem curar as suas feridas. Depois podemos falar
de todo o resto. A Igreja por vezes encerrou-se em pequenas coisas, em pequenos
preceitos… Sonho com uma Igreja Mãe e Pastora. Os ministros da Igreja devem ser
misericordiosos, tomar a seu cargo as pessoas, acompanhando-as com o Bom
Samaritano que lava, limpa, levanta o seu próximo. Isto é Evangelho puro.”
O povo de Deus está confiante, no diálogo hoje
com o crucifixo, partindo de Jesus Cristo e na figura de São Francisco, o
“último cristão” ou o “primeiro depois do Único” que dizer, de Jesus Cristo.
*Sacerdote da Arquidiocese de Fortaleza
Fonte: O Povo
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